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Viva Melhor


   


  19/12/2019 - por Welton Oda



Vivemos uma ditadura?



Apresentação

 


Como parte das comemorações pelos seus 40 anos de resistência na defesa dos direitos das/os docentes de ensino superior, a atual direção da ADUA-SSind. decidiu criar uma revista dedicada à reflexão crítica sobre o nosso país, a nossa sociedade e a nossa Universidade, uma revista de estudos e debates sobre o nosso tempo e os temas que nos dizem respeito.

 


Nesse sentido, o nome da nossa revista não poderia ser outro: Resistências – Revista da ADUA, afirmando o papel do nosso sindicato e de cada um de nós como sujeitos políticos críticos no mundo e resistentes no tempo em que vivemos.

 


Para este primeiro número, o tema escolhido foi Ecos e permanência da Ditadura na Amazônia. Com esse tema, Resistências aprofunda o debate sobre o atual momento político que vive o Brasil, inegavelmente um momento delicado, marcado por permanente crise política que se arrasta já há vários anos, colocando em risco tanto as instituições nacionais como as próprias condições de vida em sociedade.

 


Evidentemente a escolha deste tema não foi gratuita. Inegavelmente podemos caracterizar o governo Bolsonaro e os interesses que se uniram para levá-lo ao poder como uma reedição da Ditadura de 1964-1985, uma Ditadura Reeditada, inquestionavelmente piorada, se é que pode alguma ditadura ser considerada como melhor que outra.

 


Vale a pena lembrar as palavras de Florestan Fernandes em seu artigo “O significado da ditadura militar”, publicado em 1997, ao analisar as alianças de interesses que levaram ao golpe de 1964, palavras premonitórias e incrivelmente oportunas para descrever os dias atuais em nosso país: “[...] Os fios da contrarrevolução chegam aos nossos dias e de uma perspectiva militar que empobrece e inquieta as próprias forças armadas. [...] A ditadura, como constelação social de um bloco histórico de estratos militares e civis, não se.[...] A hegemonia militar perde [perdeu] terreno. A posição estratégica das elites militares – antigas ou renovadas – adquire, todavia, perspectivas de duração e de influência ultracompensadoras. Aquelas elites fixam-se ainda mais como esteio da defesa da ordem. Em suma, elas desprenderam-se da batalha militar (que não ultrapassou a encenação e alguns combates singulares), mas ganharam a guerra política. [...]” (Fernandes, 1997, 147-148).

 


Se hoje podemos dizer que vivemos uma ditadura disfarçada, devemos reconhecer que essa é ainda pior, ainda mais “pobre” do que a de 1964, uma vez que a concepção de país e sociedade que têm os militares hoje no poder, e os civis que a eles se aliam, é ainda pior, ainda mais “pobre” do que a de 1964, que levou o país aos desastrosos 21 anos Regime Militar e Ditadura.

 


Em sua maioria, os artigos reunidos neste nº 1 de Resistências foram escritos por colegas docentes da Ufam e outras Universidades, que responderam à “chamada para artigo” de parte da ADUA. Os 28 artigos aqui reunidos apresentam formatos diversos – ensaios, testemunhos, artigos de opinião e artigos acadêmicos – conformando quatro seções:

 


- Abrindo o Debate, seção especial com o mencionado artigo de Florestan, que, atualíssimo, lança luzes sobre o atual contexto político brasileiro;
- Ecos da Ditadura na Amazônia, artigos que discutem o impacto e efeitos da Ditadura na formação pessoal e da sociedade local amazonense;
- Permanências da Ditadura, artigos que analisam a herança do Regime Militar e da Ditadura ainda hoje presentes na vida nacional.
- A Ditadura Reeditada, seção especial com o artigo “Conspiração e corrupção: uma hipótese muito provável”, de José Luís Fiori e William Nozaki, que explicita antigos interesses sempre renovados, que constrangem a política nacional à “conspiração” por regimes de exceção, que assinala estratégias, sempre renovadas, de perpetuação da subordinação nacional a interesses imperialistas.

 

 

Com Resistências, a Diretoria da ADUA convida à reflexão crítica sobre o tempo em que vivemos, condição indispensável para a construção de uma sociedade mais justa, que acreditamos seja o propósito de todos nós docentes, sindicalizados ou não.
 

 

Boa leitura a todas e a todos!

 

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Vivemos uma ditadura?

7 de abril de 2019. O músico Evaldo Rosa estava com a família em seu veículo, Ford Ka Sedan branco, indo à um chá de bebê, quando teve o veículo metralhado por militares do exército, que dispararam, nada menos, do que 257 tiros de fuzil contra o carro, “confundido” com outro veículo branco que perseguiam. 62 disparos acertaram o Ford Ka, matando imediatamente o condutor. Luciano Macedo, que passava pelo local e tentou socorrer as vítimas da chacina, foi também alvejado e morreu dias depois.

 

 

Doze militares foram arrolados no caso por homicídio qualificado e omissão de socorro. Nove deles foram presos pela Justiça Militar. Somente o Tenente Ítalo disparou 77 vezes, enquanto outro acusado, o Cabo Oliveira deu 54 tiros. Três dos envolvidos mal chegaram a esquentar a cela, sendo libertados dias depois. No dia 23 de maio, o Superior Tribunal Militar decidiu, por maioria de votos, pela soltura dos demais envolvidos.

 

 

O caso é emblemático. Aconteceu nos primeiros meses do Governo Bolsonaro, envolveu uma ação brutal e desmedida de militares, vitimou uma família inocente e parece que caminha para a impunidade: a absolvição descarada dos milicos envolvidos. Maria Elizabeth Guimarães, única jurada a votar pela manutenção da prisão dos militares afirmou, em seu voto, que houve violação das regras de conduta que os militares recebem antes de cada operação. Afirmou ainda “quando um negro pobre no subúrbio do Rio de Janeiro é confundido com um assaltante, tenho dúvidas se o mesmo ocorreria com um loiro em Ipanema vestindo camisa Hugo Boss”.

 

 

Emblemático porque a marca da ditadura militar no Brasil é a mentira e a impunidade. Segundo Egydio Schwade, o Exército passou anos negando a presença de indígenas na região em que se construía a rodovia BR-174, nos governos militares. Mataram, silenciosamente, milhares de indígenas Waimiri-Atroari para conseguir passar o trator por sobre aldeias e sobreviventes. Mataram Anísio Teixeira e Wladimir Herzog e também mentiram sobre isso. Negaram enquanto puderam.
A pior das mentiras dos assassinos fardados, entretanto, é a comparação injustificada entre as mortes brutais causadas por agentes da lei com a reação de grupos armados que combatiam o regime, mentira esta que usaram para manter impunes militares de alta patente, policiais que assassinavam à paisana, militares de baixa patente e também civis aliados dos governos militares.

 

 

Tripudiar da lei, impunemente, para, em tese, combater grupos politicamente adversários, torturar e matar crianças, gestantes, idosos, estudantes, trabalhadores rurais, indígenas, jornalistas e intelectuais na condição de “agentes da lei” constitui uma situação quase única no mundo. Nossos vizinhos argentinos e chilenos, por exemplo, puniram exemplarmente os militares criminosos deste período. No Brasil, a pior porção destes militares é aliada do presidente da república, admirador de uma das piores bestas-feras da ditadura militar, o coronel Brilhante Ustra.
Se o que vivemos hoje não é uma ditadura militar, tese que defendo, por outro lado, a sensação de déjà vu é inquestionável. A absolvição descarada dos assassinos de Evaldo sinaliza, ao que tudo indica, a abertura da Caixa de Pandora do governo Bolsonaro.

 

 

Welton Yudi Oda, Departamento de Biologia, Instituto de Ciências Biológicas, Universidade Federal do Amazonas (UFAM), yudioda@yahoo.com.br

 

 

Foto: Fabio Texeira/Reuters







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