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O Estatuto, o racismo e a luta das mulheres



Em 30/06/2010

O Estatuto da Igualdade Racial, depois de muito lavado e enxaguado, ficou esgarçado, desbotado, desfigurado e só agora foi aprovado pelo Congresso Nacional, apesar da manifestação contrária de boa parte do movimento negro e de organizações anti-racistas.

Existe racismo no Brasil. Só nesse contexto, é possível entender como um Estatuto com esse nome, após ter tramitado por mais de uma década na Câmara e no Senado (apresentado pela primeira vez em 1995), pôde ser completamente esvaziado, destituído de todo o seu potencial transformador e, ainda assim, ser aprovado.

Nessa longa caminhada, foram inúmeras as perdas. Nos primeiros anos, o grande problema parecia ser a criação de um fundo público destinado à promoção da igualdade e enfrentamento do racismo, que sustentaria as medidas previstas no Estatuto. Naquela época, a oposição à igualdade racial era velada, em geral se escondia atrás desse argumento, ponderando que o financiamento das ações não precisava de um fundo específico, de recursos carimbados exclusivamente para esse fim, que o orçamento público, com diretrizes bem definidas, já seria suficiente.

Depois que o debate sobre o financiamento das políticas de promoção da igualdade e enfrentamento do racismo foi vencido, outra onda começou a se armar na tentativa de fazer naufragar o debate público sobre a existência do racismo no Brasil e evitar quaisquer medidas que atentassem contra os privilégios conferidos aos brancos.

A proposta de quotas raciais nas universidades, que àquela altura dos acontecimentos já havia promovido um grau inédito de inclusão social e racial no ensino superior foi satanizada. A mídia de massa entrou com tudo nessa discussão. Toda sorte de argumentos absurdos, contradizendo as evidências, os dados e as experiências recentes, foram veiculados: “o estatuto vai racializar a sociedade brasileira”, como se a idéia de raça, da superioridade branca e inferioridade negra não tivesse fundado o Brasil desde a colônia; “não existe racismo no Brasil”, como se quem vive o racismo na pele, na verdade estivesse sofrendo delírios; “as quotas vão racializar a sociedade brasileira e gerar confrontos que hoje não existem”, como se o assassinato de jovens negros pela polícia nesse país fosse uma peça de ficção.

Anualmente, o número de crianças negras que morrem no Brasil é praticamente o dobro das brancas. A morte materna, evitável em 92% dos casos, atinge aproximadamente 6 vezes mais as mulheres negras do que as brancas. Contudo, o Estatuto, encaminhado à sanção do Presidente Lula, exclui diversos outros dispositivos: o que estabelecia a política nacional de saúde da população negra, que fazia referência à redução da mortalidade infantil e materna, e das mortes violentas; foram eliminadas referências à escravidão, reparação e compensação, bem como extirpadas do texto as palavras raça, racial e raciais; e, conseqüentemente, todas as ações afirmativas foram eliminadas.

Descartada por absurda a hipótese do azar, só nos resta uma para explicar tanta desigualdade entre negr@s e branc@s: existe racismo no Brasil, entranhado na sociedade e consolidado no poder. E o racismo se manifestou através do relator do Estatuto, Demóstenes Torres (DEM/GO), que por sinal é responsável por outros desserviços jurídicos e manifestações direitistas. É dele a responsabilidade pelo enfraquecimento punitivo e político do “Ficha Limpa” (LCP 135/2010), por isso aprovado por unanimidade no Senado Federal. Ele também é autor do machismo jurídico criado pela reforma dos crimes sexuais (Lei 12.042/2009), que atenuou a pena para estuprador. A reforma do Código de Processo Penal, por ele relatada, está pondo em risco a Lei Maria da Penha a ponto de, se aprovada, tornar quase inócua uma das leis mais importantes para as mulheres. Porém, ele sozinho não é o “remédio heróico” para manter os privilégios raciais dos brancos. Os créditos dos desmandos reacionários devem ser divididos (ou negociados) com o governo Lula e parlamentares da dita esquerda que, quando fizeram muito, ficaram calad@s nas discussões.

Às vésperas do Dia da Mulher Negra Latino Americana e Caribenha (25 de julho), como feministas que somos, queremos cumprimentar as mulheres negras brasileiras pela coragem e ousadia, pela disposição para os embates e diálogos democráticos, sem os quais, seria impossível enegrecer o feminismo (como disse Sueli Carneiro), fazer germinar, ver crescer e frutificar um movimento de mulheres anti-racista. Movimento este que tem o potencial de ampliar o debate público contra o racismo, inclusive para enfrentar a irrelevância das instituições do sistema político frente ao grande desafio democrático que é a igualdade racial e para as mulheres.

Guacira Cesar de Oliveira é socióloga, diretora colegiada do CFEMEA e integrante da coordenação executiva nacional da AMB.

Artigo originalmente publicado pelo CFEMEA (Centro Feminista de Estudos e Assessoria)



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