| Data: 05/01/2017
 Tema debatido geralmente  em novembro, quando se comemora o Dia da Consciência Negra - no dia 20 -  a questão étnico-racial no ambiente acadêmico levanta questionamentos  pertinentes sobre o nível de representatividade negra nas universidades  públicas brasileiras, seja entre estudantes ou professores. Na  Universidade Federal do Amazonas (Ufam), um exemplo  da necessidade  urgente de enfrentamento ao racismo institucional foi a absurda reação  aos cartazes fixados por membros do Coletivo Negro Alexandrina que  questionavam, com base em pesquisa realizada na Universidade de Brasília  (UnB), a quantidade de professores negros na instituição. Os cartazes  chegaram a ser pichados e destruídos.
 
 Membro do coletivo  Feminista Baré, da Rede Fulanas-NAB, da Rede de Ciberativistas e  estudante do curso de Pedagogia da Ufam, Raescla Ribeiro afirma ser  preciso questionar os motivos que fazem com os negros formados  não se  tornem professores universitários. Categórica ao defender que a  comunidade acadêmica da Ufam é racista, Raescla chama a atenção para um  dado alarmante: cursando o 6º período de um curso destinado a formar  professores, teve, até agora, dois docentes negros.
 
 A presença  de professores e discentes negros no ambiente universitário configura um  importante mecanismo de aferição de resultados de políticas afirmativas  voltadas a este segmento. A identificação da representatividade  demonstra que esses atores estão inseridos e conseguem permanecer na  universidade, situação que, segundo a estudante, "por muitas vezes nós  não vemos na Ufam".
 
 Outro ponto que, de acordo com Raescla  Ribeiro, precisa ser feito é afinar as reivindicações da classe  trabalhadora com a defesa dos direitos dos negros para garantir o  fortalecimento da mobilização e a manifestação do desconforto com as  desigualdades étnico-raciais, incluindo as fomentadas por práticas   docentes como o assédio sexual contra estudantes negras e a indiferença  com a  evasão de discentes negros.  Isso é necessário, conforme a  estudante, "se nós queremos uma educação que vá contra um governo  golpista e que construa uma cidadania", para que não se corra o risco de  defendermos um discurso hipócrita.
 
 Desafios
 
 Para a  professora do Instituto de Natureza e Cultura (INC), da Ufam, em  Benjamin Constant, e coordenadora do Núcleo de Estudos Afro Indígena  (NEAINC) da instituição, Renilda Aparecida Costa, o racismo  institucional e o assédio existem, mesmo os brasileiros não se  considerando racistas. A discriminação por meio de atitudes e não de  palavras ocorre na Ufam, segundo Renilda, assim como em outras  instituições da sociedade e se configura como um desafio para docentes,  estudantes e técnicos-administrativos negros. "A universidade foi  construída em bases racistas. Os alunos que entram por ações  afirmativas, muitas vezes, são inferiorizados porque essas ações são mal  interpretadas. Elas estão ligadas a uma dívida que o estado brasileiro  tem com os negros. O sistema de cotas trouxe um novo olhar e novas  pessoas puderam fazer parte da universidade. Devemos ter o pensamento de  que as pessoas merecem reconhecimento e dignidade na sua identidade",  aponta a docente.
 
 Focadas em acordos internacionais, nos quais o  Brasil se compromete em vencer as desigualdades raciais, as políticas,  de acordo com Renilda Costa, mesmo tendo caráter de estado para impedir a  descontinuidade, tendem a sofrer oscilações em função das prioridades  adotadas por cada estadista. Situação que se evidencia nos ataques aos  direitos trabalhistas praticados pelo atual governo, dentre eles o  Projeto  de  Lei nº 116/2017 que prevê a demissão dos servidores  públicos por insuficiência de desempenho, abrindo espaço para a  prática de perseguição no ambiente de trabalho. "O problema dessa  novidade da perda da estabilidade funcional é o uso político-partidário  que se faz. O concurso público na trajetória da história foi criado para  que o racismo não operasse. Os negros tiveram ascensão na universidade  através do concurso público. Essa medida afeta diretamente a população  negra, uma vez que o rosto que indica [cargos] não é negro, nem  indígena".
 
 As reivindicações da população negra e dos movimentos  ativistas perpassam a sociedade como um todo e a universidade não está  excluída desse debate. Para o pesquisador fundador do movimento Afro  Amazonas, Juarez Silva, muitas temáticas negras permaneceram por muito  tempo "escamoteadas" na academia, mas agora já conseguem ser debatidas  com um pouco menos de resistência. "Esperava-se que certas coisas fossem  mais fáceis, mas ainda não são", afirma.
 
 Uma das dificuldades  práticas vivenciadas dentro da universidade, de acordo com Juarez, é a  criação de políticas institucionais de cotas na pós-graduação. "Na  graduação o resultado é praticamente advindo do vestibular. Já na  pós-graduação se enfrenta etapas altamente subjetivas que têm alijado os  pesquisadores negros e quem estuda a temática". Cabe, portanto, o  enfrentamento de mais esse obstáculo à formação educacional dos negros  e, consequentemente, à luta por igualdade.
 
 Fonte: ADUA
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