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  03/06/2020


Pandemia escancara vulnerabilidade e descaso com negros e indígenas



A pandemia do corona vírus escancarou a desigualdade social em todo mundo. No Brasil, populações periféricas, povos indígenas, negros, negras e quilombolas estão no topo da lista dos mais afetados. Sem políticas públicas específicas para o combate à disseminação da Covid-19, a cada dia crescem os números de contaminados e mortos em aldeias, favelas e pequenos municípios dos Estados brasileiros. Somente em duas semanas no mês de maio, o número de mortes de indígenas cresceu 70%.

 

Somada a falta de proteção governamental durante uma das maiores crises sanitárias da história, estas populações continuam sendo alvos de ataques sistemáticos do governo Bolsonaro. É o caso, por exemplo, do Projeto de Lei 2.633, PL da Grilagem, que possibilita a regularização fundiária de terras invadidas, inclusive as indígenas; o desmonte do PL 1.142, que cria a o Plano de Emergencial de Enfretamento à Covid-19 entre os povos indígenas, quilombos e comunidades tradicionais; a perseguição ao Conselho Indigenista Missionário (Cimi), etc.

 

O descaso e o pacto com o genocídio dessas populações refletem em tristes números. Até 25 de maio, 1.140 indígenas foram infectados pela Covid-19 e 131 morreram em decorrência da doença. O Amazonas é o Estado com maior número de mortes (93), seguido do Pará (13) e de Pernambuco (8). A Covid-19 já atinge povos em todas as regiões do país. São 61 afetados, no total. Os dados são do Comitê Nacional pela Vida e Memória Indígena, divulgados pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).

 

Do dia 10 a dia 23 de maio, o número de mortes de indígenas em decorrência do novo corona vírus aumentou 70%, passando de 77 para 131 mortes, ainda de acordo com informações do Comitê. A gravidade da situação dos povos indígenas fica evidente ao comparamos a taxa de letalidade entre essa população (11,4%) e a população em geral (6,3%).

 

Esses números diferem dos repassados pelo governo. Até a mesma data, os registros na Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) - órgão vinculado ao Ministério da Saúde – eram de 760 indígenas contaminados e 35 mortos. Há denúncias de que a Sesai não contabiliza os indígenas que moram em áreas urbanas, o que aprofunda a subnotificação e tem provocado críticas das organizações indígenas e da sociedade civil.

 

Conforme o último Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), realizado em 2010, havia 896 mil pessoas que se declararam ou se consideraram indígenas, sendo 572 mil (63,8%) – ou seja, a maioria, – residentes em áreas rurais.

 

Na divulgação da Sesai do dia 22 de abril, por exemplo, havia quatro mortes confirmadas, sendo um Kokama, um Sateré-Mawé, um Yanomami e um Tikuna. Os dados da União deixavam de fora a morte de Lusia Lobato dos Santos, 87 anos, do povo Borari, na Vila de Alter do Chão (PA), que morreu em 19 de março; e dos irmãos da etnia Apurinã Adilson Menandes dos Santos, 77, falecido em Manaus em 20 de abril; e Clevelande, que morreu um dia depois, conforme apuração do observatório “De olho nos ruralistas”.

 

Os dados da Sesai também não esclarecem quais são os povos atingidos e os municípios onde estão localizados, o que dificulta o monitoramento e o auxílio a essas comunidades. Os números do governo são disponibilizados por Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei), que somam 34 em todo o Brasil.

Municípios de risco

 

Um monitoramento da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) aponta que um terço dos indígenas brasileiros residem em municípios com alto risco de contaminação por Covid-19. A pesquisa analisa o potencial de exposição de populações indígenas.

 

Dos 817 mil indígenas considerados nas análises, 279 mil (34,1%) moram em municípios com alto risco para epidemia e 512 mil (62,7%) residem em municípios com baixo risco. Com a interiorização da epidemia deve ocorrer um expressivo aumento da quantidade de indígenas em alto risco.

 

Segundo a pesquisa, Terras Indígenas em municípios com alta probabilidade de introdução de Covid-19 ficam, em sua maioria, próximas de centros urbanos como Manaus, Rio Branco, Porto Velho, Fortaleza, Salvador e capitais do Sul e Sudeste. A população indígena em zona urbana, de 190.767 pessoas, reside majoritariamente em municípios com alto risco para a doença. No Centro-Oeste, esse grupo em alto risco corresponde a 67,5% da população indígena urbana da região; no Sul-Sudeste, a 79,4%.

 

O pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz) e do Grupo de Trabalho (GT) em Saúde Indígena da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), o médico Andrey Moreira Cardoso, esclarece que os povos indígenas têm uma vulnerabilidade maior do ponto de vista epidemiológico. “Há vários estudos internacionais, comparando a situação dos povos indígenas em diferentes regiões do mundo, mostrando que eles estão sempre em desvantagem econômica, social e de saúde em relação a outros grupos nas mesmas localidades, isso é uma realidade também no Brasil”.

 

As medidas de prevenção também vão encontrar diversas limitações em territórios indígenas devido às dificuldades como de abastecimento de água, as características próprias do modo de vida mais coletivo e a diversidade linguística, alerta a médica sanitarista, pesquisadora e professora da Ensp/Fiocruz e coordenadora do GT em Saúde Indígena da Abrasco, Ana Lúcia Pontes, acrescentando que a comunicação com esses povos deve considerar as 274 línguas indígenas no país.

 

Para a médica sanitarista que participou, no dia 16 de abril, da live da ADUA “Saúde indígena em Tempo de Pandemia”, a estratégia fundamental é evitar a entrada da Covid-19 em território indígena, além da definição clara de fluxos e protocolos seja em contexto urbano ou rural. “O isolamento, a restrição da entrada e saída de pessoas é fundamental, assim como a retirada de invasores e ocupações ilegais é muito importante para que essas pessoas não transmitam o corona vírus para os povos indígenas”.

 

As vulnerabilidades estruturais das regiões onde os indígenas estão localizados impulsionam ainda mais a gravidade da situação. “As comunidades indígenas estão, geralmente, em municípios de pequeno porte que já têm uma estrutura precária de saúde, e não vai ter leitos de UTI suficientes no caso de agravamento da doença, o que é necessário para evitar o número de óbitos decorrentes dessa doença”, disse.

 

Medidas urgentes

Essa realidade foi denunciada em vídeo para a ADUA gravado pela 1ª diretora vice-presidente da Federação Indígena do Povo Kokama e conselheira do Fórum de Educação Escolar Indígena do Amazonas (Foreeia) e da Frente Amazônica de Mobilização em Defesa dos Direitos Indígenas (Famddi), Milena Kokama. “Nós precisamos urgente de testes rápidos, não temos equipamentos, Tabatinga já entrou em colapso, os municípios não têm estrutura. E não é só na aldeia, mas os indígenas que vivem também em contexto urbano, estamos morrendo à míngua dentro de hospitais porque não tem respirador, equipamentos materiais de higiene...”, disse.

 

Na fala emocionada, a líder indígena do Alto Solimões (região com grande número de indígenas afetados) denunciou o descaso das autoridades e clamou por ajuda. “É uma denúncia do abandono dos municípios do Amazonas pelo Governo, o meu povo pede socorro, nós, povos indígenas, estamos morrendo (...) precisamos pedir ajuda das autoridades, quem puder nos ajudar, vamos evitar um genocídio, porque nós estamos caminhando para isso, nos ajude porque viver também é resistir!”, disse a indígena que também participou da live da ADUA sobre saúde indígena.

 

O apelo foi feito também por meio da nota pública “Nós, Povo Kokama, pedimos socorro, estamos morrendo!”, divulgada em maio. “As cidades de Tabatinga, Benjamin Constant e Santo Antônio do Iça, Estado do Amazonas, encontram-se declaradas à contaminação comunitária. O prefeito de Tabatinga e o DSEI (Distrito sanitário especial indígena) do Alto Solimões comunicaram que a situação está fora de controle. E nós, povo Kokama, estamos registrando óbitos todos os dias. Estamos aflitos e desesperados. Nós estamos indignados devido à negligência, descaso e omissão do poder público a nível Federal, Estadual e Municipal”, diz trecho.

 

O colapso no sistema de saúde público e a falta de estruturas hospitalares e de equipamentos são denunciados na nota do povo Kokama, que também relata o despreparo das equipes médicas no atendimento aos indígenas. “Soma-se ao descaso das unidades de saúde, o desconhecimento no trato com os povos indígenas, negando a nossa identidade. De fato, o Hospital Militar HGUT de Tabatinga tem insistido em registrar na declaração de óbito do nosso parente como ‘pardo’. Queremos deixar claro a todos que RANI não faz a gente indígena! E sim, o reconhecimento de nossos líderes e representantes natos KOKAMA”.

 

Povos indígenas Kokama, Mura, Sateré e Tikuna do Amazonas e mais 18 etnias dos Estados Mato Grosso, Rondônia, Acre, Ceará e Maranhão lançaram, em abril, uma carta-manifesto e um vídeo exigindo a aplicação de uma série de demandas como a proteção das aldeias, ações de saúde pública específicas, garantia de alimentação e demarcação de territórios.

 

Na carta endereçada ao governo federal, à Funai e ao Ministério Público Federal (MPF), os indígenas afirmam que desde a chegada dos primeiros colonizadores ao Brasil, são vítimas de constantes ataques ao direito de existir. “Lutamos com nossos corpos contra o sistema econômico que insiste em nos violentar e destruir a nossa mãe terra. Assassinam nossos parentes. Poluem nossos rios. Derrubam nossas florestas e nos expulsam de nosso lar sagrado. Tudo isso por propriedade e lucro”, afirmam.

 

Considerando estes fatores, a preocupação com todos os povos indígenas brasileiros durante a pandemia e as violações aos territórios, os indígenas exigem a implantação de medidas emergenciais para a garantia do bem viver. Entre as demandas estão: a aplicação de ações de saúde para o combate a pandemia na língua materna das etnias; a distribuição de kits de higiene pessoal e máscaras nas aldeias e a agilidade na apuração dos crimes contra indígenas.

 

O coordenador do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) do Maranhão, Gilderlan Rodrigues, explicou, em entrevista ao Sindicato Nacional, elencou uma série de medidas que já deveriam estar sendo colocadas em práticas por órgãos competentes como Sesai e Fundação Nacional do Índio (Funai). Uma delas é o aumento da proteção aos territórios indígenas, uma vez que, segundo ele, os madeireiros continuam entrando nos territórios e praticando ações ilegais.

 

“Seja para conter a chegada do vírus ou para conter a presença de madeireiros ou caçadores que podem levar o vírus para as aldeias. Então, em poucas palavras, mais do que nunca os territórios indígenas deveriam estar preservados e isolados. Somente dessa forma seríamos capazes de mantê-los seguros e salvos (...) Sabemos que o pico desse vírus está na sociedade não indígena e é por este motivo que precisamos estar preparados para que as comunidades se mantenham isoladas”, explicou.

 

Outra medida fundamental, segundo Gilderlan Rodrigues, é assegurar o envio de materiais básicos como álcool gel, sabão e alimentos, além de testes rápidos e profissionais da saúde com proteção individual. “Dessa forma, será possível permitir que indígenas suspeitos de contaminação ou infectados possam permanecer em quarentena durante o período necessário ou que sejam encaminhados a centros hospitalares de regiões próximas, caso necessário”, comentou.

 

O coordenador do Cimi no MA explicou que o governo deve também garantir o sustento das famílias uma vez que, estando em quarentena, não conseguem plantar, colher e vender artesanatos. Outra medida necessária é a facilitação da locomoção até as aldeias. “No Maranhão, por exemplo, existe a aldeia Juriti e o acesso até lá é extremamente difícil. Sem estradas, a única forma de chegar ao local é através de barcos. Se alguém for infectado, testá-lo e direcioná-lo para a quarentena com agilidade poderá diminuir o risco de contaminação dos outros da aldeia”.

 

Gilderlan Rodrigues comenta que os ataques contra a demarcação de terras indígenas se acentuaram no atual governo e persistem mesmo na pandemia. “Tem como finalidade a exploração e entrega [de territórios indígenas] para os latifúndios. Os povos continuam lutando e também denunciando invasões embora saibamos que o atual governo não tem dado a devida importância para os territórios indígenas. O atual governo mantém a política de exploração da Amazônia e aí está um risco muito grande para todos os povos brasileiros”.

 

Ataques

 

Mesmo em meio a pandemia, os ataques aos povos tradicionais continuam. Depois de ser retirada da pauta de votação da Câmara, a MP 910 retornou como o PL 2.633/20, que beneficia grileiros em detrimento à preservação da Amazônia e aos indígenas que há mais de 500 anos sofrem com invasões e dizimação. Em nota, o ANDES-SN manifestou-se contra o PL. “Diante do aumento das queimadas e desmatamentos na Amazônia, assim como das invasões em terras indígenas, é escandalosa a manobra parlamentar que busca aprovar uma lei que pode incentivar crimes ambientais e de grilagem”.  

 

Por outro lado, a bancada do governo na Câmara desmantela o PL 1.142, que cria a o Plano de Emergencial de Enfretamento à Covid-19 para indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais. “Querem nos exterminar e não tem vergonha de fazer isso (...) Essa semana tentaram enfiar goela abaixo o PL da Grilagem que só pior a nossa situação e não querem aprovar um projeto que vai proteger os povos indígenas e quilombolas. É inadmissível essa política de morte. Convoco toda a sociedade a pressionar o Congresso e impedir isso”, escreveu em suas redes sociais a liderança indígena Sônia Guajajara.   

 

Enquanto os povos indígenas clamam por assistência, a Funai não apenas deixa desassistidas as necessidades básicas para conter a Covid nas aldeias como está ocupa-se em atacar o Cimi. Na nota “Os Fatos”, a Fundação afirmou que o governo Bolsonaro rompeu com “o socialismo” no Brasil quando foi eleito e “repudiou” entrevistas do diretor do Cimi que denunciou a falta de mobilização da Funai para proteger os indígenas durante a pandemia.

 

A Funai não menciona como tem combatido o corona vírus nas aldeias. Para o órgão, situações de vulnerabilidade relatadas pelos indígenas, incluindo as ameaças de invasores de terras motivados pelo discurso antidemarcação de Jair Bolsonaro, são decorrentes de políticas “paternalistas” de governos anteriores e os quase 20 anos de “socialismo” no País. “Nestes quase 20 anos de administração socialista no Governo Federal, a política indigenista brasileira restringiu-se ao assistencialismo subserviente e ao paternalismo explícito, com o aplauso, a complacência e a participação de ONGs e grupos religiosos ligados à Teologia da Libertação, de matriz marxista”, diz trecho do documento.

 

A nota foi uma retaliação as denúncias feitas pelo secretário-executivo do Conselho, Antônio Eduardo de Oliveira. “Praticamente, a Funai se ausentou totalmente. A iniciativa de isolar os territórios para conter a Covid-19 foi dos próprios indígenas”, disse. Em outra entrevista, Antônio afirmou que “o atual governo se instaurou com o propósito de destruir tudo o que havia sido construído pela sociedade civil organizada nos últimos anos”. À Funai foram repassados R$ 10.840 milhões para proteção de indígenas contra o avanço do corona vírus, mas quase nada tem sido feito.

 

Desmatamento

 

Paralelo à pandemia, o desmatamento na Amazônia em abril foi o maior dos últimos 10 anos. Com 529 quilômetros quadrados, a área desmatada aumentou 171% em relação ao mesmo mês de 2019. Os dados do Sistema de Alerta do Desmatamento (SAD) foram divulgados, no dia 18 de maio, pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon).

 

Do total desmatado, 32% estão localizados no estado do Pará. Na sequência, Mato Grosso respondeu por 26% do desmatamento registrado no mês, Rondônia por 19% e o Amazonas por 18%. Em reportagem, o site de notícias Uol destacou que “o avanço na destruição da floresta ocorre, justamente, no momento em que a pandemia do novo coronavírus atinge seus números mais altos no país e que há o temor que a doença dizime comunidades indígenas que vivem por todo o norte do país”.

 

Os números são reflexos da política antiambiental e de perseguição étnico-racial de Bolsonaro, que mantém em seu governo contrários aos próprios temas da pasta como é o caso do ministro do meio ambiente, Ricardo Salles. Em vídeo da reunião ministerial divulgado no dia 22 de maio por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), Salles fala em aproveitar o foco da imprensa na Covid para “ir passando a boiada”, o que significa aprovar reformas e simplificar normas ambientais. Na mesma ocasião, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, afirma: “odeio o termo povos indígenas, odeio esse termo, odeio. Ou povos ciganos [...] acabar com esse negócio de povos e privilégios".

 

Repúdio

 

Advogados, antropólogos, professores, sociólogos, jornalistas, pesquisadores e outras categorias manifestaram repúdio à nota da Fundação contra o Cimi. Em nota conjunta, os profissionais expõem que o ataque torpe e sórdido feito pela atual gestão da Funai deriva de uma postura absolutamente contrária aos interesses legítimos dos povos indígenas do Brasil. “Esses interesses, ao contrário do que dizem os governantes de plantão, não estão em jogo. Não podem ser malbaratados por este ou por qualquer outro governo”, afirma o Conselho.

 

A nota afirma, ainda, que “a sordidez, o vilipêndio, deste despropositado ataque da atual administração da Funai a um órgão vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) que tem, ao longo de décadas, prestado inestimável aporte à luta dos povos indígenas do Brasil, sem embargo, também dos apoios emprestados à causa indígena em toda América Latina, é algo que certamente deve ser não só repudiado, mas recusado taxativamente como um posicionamento que se põe ao arrepio dos mandamentos constitucionais”.

 

População negra

A exclusão histórica de negras e negros na sociedade brasileira, após a abolição legal da escravidão, tornou-se mais explícita na pandemia. Levantamentos mostram que a população negra da sociedade está entre a que mais morre de Covid-19.

 

O risco de morte é 62% maior entre negros e negras em relação aos brancos e brancas, conforme dados do boletim epidemiológico da Prefeitura de São Paulo divulgados em 30 de abril. Entre os pardos, o índice é de 23%.

 

Maior parte da população pobre do país, o povo negro está mais suscetível ao adoecimento e morte por Covid-19 por questões socioeconômicas como ausência de saneamento básico, insegurança alimentar e dificuldade de acesso à assistência médica, de acordo com informações do boletim.

 

Para se ter ideia da dimensão da situação, o total de pessoas negras mortas por Covid-19 no Brasil quintuplicou em duas semanas. É o que apontam dados da Agência Pública de Jornalismo. De 11 a 26 de abril, as mortes de pacientes negros confirmadas pelo governo federal saltaram de pouco mais de 180 para mais de 930.  A quantidade de negros hospitalizados por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) causada por coronavírus cresceu 5,5 vezes.

 

O levantamento da Agência Pública escancara a desigualdade racial no Brasil. Nas mesmas duas semanas, o aumento de mortes de pacientes brancos chegou a pouco mais que o triplo, enquanto que de brancos hospitalizado subiu em proporção similar. Considerando os dados, há uma morte a cada três negros hospitalizados por SRAG ocasionada por corona, e uma morte a cada 4,4 hospitalizações de pessoas brancas.

 

Em entrevista ao ANDES-SN, a professora de Serviço Social da Universidade Federal Fluminense (UFF) e coordenadora do Núcleo de Estudos Afrobrasileiros (NEAB/UFF) em Rio das Ostras (RF), Maria Raimunda Soares, afirmou que os números reforçam o que pesquisadores e movimentos já indicavam: as condições estruturais de reprodução e socioeconômicas tornam o índice de mortalidade da Covid-19 maior entre os negros.

 

“É muito emblemático que a primeira morte no Rio de Janeiro pela Covid tenha sido de uma empregada doméstica negra, moradora de uma comunidade e que trabalhava na zona sul do Rio. Isso desmente uma ideia que foi difundida no início da pandemia de que o vírus seria democrático, de que atingiria indistintamente brancos e negros, pobres e ricos, trabalhadores e não trabalhadores. Vemos que isso não é verdade”, disse.

 

Para a docente, essa desigualdade de contaminação e de mortes leva o governo Bolsonaro e a classe dominante a pedirem o fim do distanciamento social. “Porque sabem que os mais atingidos serão pessoas da população negra e das periferias. Há uma indiferença com a morte de pobres e negros, e isso expressa a necropolítica desse governo e o racismo estrutural e institucional que vigora no país”, afirmou.

 

Quilombolas

 

Em meio a luta por sobrevivência na pandemia, os quilombolas também estão sob ataque do governo Bolsonaro. Cerca de 800 famílias de 30 comunidades quilombolas de Alcântara (MA) ficaram duplamente vulnerabilizadas com a Resolução 11/2020, publicada no dia 26 de março, que determinou a expansão do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA) na área ocupada pelas famílias, que agora não apenas estão expostas à Covid-19 como também correm o risco de serem expulsas de suas terras. Para combater o vírus, não há qualquer plano de ação governamental para proteger as comunidades indígenas e quilombolas da região.

 

Assinada pelo general Augusto Heleno, a resolução determina que as famílias serão removidas pela Aeronáutica e reassentadas pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Com a medida, o governo desconsidera a Convenção 160 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que prevê uma consulta prévia, livre e informada, e se antecipa à conclusão dos estudos técnicos do Comitê de Desenvolvimento do Programa Espacial Brasileiro, que teve o prazo final prorrogado em 180 dias.

 

Entidades da sociedade civil como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Coalizão Negra por Direitos e mais 136 organizações populares divulgaram nota em repúdio à remoção das famílias quilombolas. Em nota de repúdio, o ANDES-SN expôs ser contrário à ampliação do território a ser ocupado pelo CLA e ao ataque ao direito das famílias quilombolas. “O próprio Acordo de Salvaguardas Tecnológicas já é absurdo e coloca em cheque o direito secular de diversas famílias que ali vivem, e se torna ainda mais grave ao propor a remoção em uma conjuntura de pandemia mundial”, comentou o 2º Tesoureiro do ANDES-SN, Cláudio Mendonça.

 

A fragilidade social dos povos indígenas, negros e quilombolas não é de hoje, mas tem sido agravada durante o atual governo de extrema-direita. Com uma agenda desde o seu início totalmente contrária aos povos tradicionais e à preservação do meio ambiente, Bolsonaro dá continuidade ao genocídio de indígenas, negros e negras durante o crítico período da pandemia não apenas negando assistência e isentando-se da criação de políticas públicas específicas para o combate do vírus, mas ao promover ataques através de MPs e PLs. A análise desta conjuntura evidencia ainda mais a necessidade da mobilização de entidades e movimentos sociais na luta e na defesa dos direitos dessas populações. Avante!

 

Fotos: MICHAEL DANTAS/AFP/REPRODUÇÃO; BRUNO KELLY/REUTERS/REPRODUÇÃO e IOONWATCH.ORG.BR/REPRODUÇÃO

 



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