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  08/02/2021 - por Isaac W. Lewis



Crônica de um país colonizado



Nos países colonizados, muitas pessoas ficam perplexas ao tomarem conhecimento de que alguns indivíduos se utilizam de suas condições favorecidas para usufruírem de vantagens, benefícios, privilégios como se ainda vivêssemos em um regime colonial onde poucas pessoas detinham direitos, privilégios às custas da carência e do sacrifício da grande maioria da população desfavorecida. O mais surpreendente é que esses indivíduos das classes favorecidas declaram continuamente que vivemos em um estado democrático de direito. Isso ocorre porque esses indivíduos frequentaram escolas, faculdades e até universidades onde aprenderam que deveriam estudar saberes técnico-profissionais para atuarem na sociedade sem refletirem: que sociedade é essa onde irão atuar? Que saber técnico irão aprender? Como se desenvolveram a sociedade e os saberes técnicos? Para que servem os saberes técnicos na sociedade onde irão atuar? Ademais não se interessam em saber se vivemos em um estado democrático de direito ou em um estado burocrático de direito. Como surgiu o estado democrático de direito e como surgiu o estado burocrático de direito? Esses egressos de nossas escolas e faculdades supõem-se civilizados, seres humanos superiores, mas, na realidade, agem e vivem como a maioria dos animais domésticos e selvagens. Por exemplo, as galinhas e os galos nascem pintinhos, crescem ciscando o chão em busca de seus alimentos. Não se perguntam se amanhã haverá chão, não se preocupam em saber como surgiu a terra onde vivem, não precisam de respostas fáceis elaboradas por sacerdotes na pré-história e, muito menos, lhes interessam saber se alguns cientistas descobriram fatos que refutaram os falsos conhecimentos propagados pelos sacerdotes. As galinhas põem ovos, chocam seus ovos e quando nascem os pintinhos, elas caminham pela terra ciscando, alimentando-se de minúsculos animais, os pintinhos, por sua vez, aprendem a fazer as mesmas coisas para se tornarem galos ou galinhas. Esses animais não precisam de um estado burocrático de direito, camuflado de estado democrático de direito, para se beneficiarem de vantagens indevidas.

 

No mundo antigo, o estado burocrático foi modelado para garantir os direitos e os interesses dos grupos favorecidos e, ao mesmo tempo, negar direitos para a grande maioria das classes desfavorecidas (de fato, as classes trabalhadoras) e também desconsiderar os interesses dessas classes. A sociedade indiana antiga constituía um exemplo em que as castas favorecidas usufruíam da exploração do trabalho da maioria da população desfavorecida, que vivia eternamente empobrecida. No século VI a. C., um brâmane, chamado Sidarta Gautama, o Buda, depois de refletir sobre a miséria em que vivia a maioria da população, concluiu que todos os seres humanos eram iguais, propondo a abolição do sistema de castas privilegiadas e de castas desfavorecidas. Entretanto a ideia e a prática da desigualdade e injustiça continuaram prevalecendo no mundo (incluindo Grécia, Roma, Judeia), onde as concepções religiosas orientavam o comportamento social de suas populações tanto para o bem quanto para o mal. As sociedades cristãs e muçulmanas adotaram e sintetizaram os rituais e os princípios preconceituosos e discriminatórios das religiões antigas (tanto as primitivas quanto as pré-históricas). Essas concepções podem ser assimiladas em obras literárias. Na Grécia Antiga, Ésquilo (525-456 a. C.) e Sófocles (495-406 a. C.) produziram tragédias nas quais os destinos dos personagens eram determinados pelos deuses. Vale ressaltar que alguns autores discordaram disso. Menandro (342-290 a. C.), por exemplo, elaborou obras literárias, ressaltando que os personagens são responsáveis pela sua felicidade ou infelicidade. Na Itália, no século XIV, Bocaccio, no livro Decamerão, elaborou uma série de contos em que os personagens são responsáveis por suas vicissitudes ou idiossincrasias.

 

A partir do século XIV, vários estudiosos começaram a refletir sobre os conhecimentos herdados das civilizações antigas, construíram novos métodos epistemológicos para construção e aprimoramento dos conhecimentos humanos. Aprendemos que os estados burocráticos de direito surgiram no período de transição da pré-história para os períodos históricos quando os seres humanos decidiram dividir as tarefas necessárias para a sobrevivência da comunidade. Surgiram as atividades específicas de pescadores, pastores, caçadores, coletores de frutas etc. Essa divisão trouxe enriquecimento para várias coletividades, havendo, então, necessidade de outras divisões de tarefas. O acúmulo de produtos tornou necessária a preparação de pessoas para controlar e dividir os produtos de acordo com as necessidades de cada pessoa ou de cada grupo de pessoas. Para guardar e proteger os produtos de serem saqueados por grupos humanos, foi necessário que guerreiros fossem designados para defenderem a produção da coletividade. Depois de algum tempo, surgiu a necessidade de coordenar ou administrar todas as tarefas da coletividade. Surgiram os faraós, os comandantes, os reis, os chefes etc. A divisão mais estrutural ocorrida nesse período foi a divisão do trabalho mental do trabalho manual. Surgiram os sacerdotes, especializados em explicar o destino, o bem, o mal, a tragédia e a fatalidade produzidos pelas divindades do bem ou do mal. Tais sacerdotes se autodenominaram representantes ou filhos dessas divindades.  Nesse período, alguns coordenadores e sacerdotes começaram a administrar os bens coletivos como se fossem seus bens particulares e começaram a inventar leis, mandamentos, diretrizes para serem obedecidos pelas classes desfavorecidas, declarando que tais leis, mandamentos  e diretrizes foram determinados por alguma divindade superior para o bem de todos, de tal sorte que as vantagens, benefícios e privilégios eram acessíveis às classes favorecidas dirigentes, enquanto que as classes trabalhadoras desfavorecidas eram destituídas de qualquer direito. A sociedade humana começou a tornar-se complexa.

 

Vários estudiosos começaram a questionar sobre a origem da desigualdade e injustiça nas sociedades humanas. Logo surgiram propostas para abolir as discriminações entre os seres humanos. Depois de muitos debates (como os escritos produzidos pelos enciclopedistas franceses) e combates (como as revoluções ocorridas na Inglaterra e na França), novas organizações sociais foram projetadas para os seres humanos. Consensualmente, os revolucionários decidiram pelo estabelecimento de um estado democrático de direito que considerasse a igualdade de todos os seres humanos e o direito de todos à liberdade, abolindo-se os estados burocráticos que consideravam os interesses e privilégios das classes favorecidas. Nos países colonizados (o Brasil, em especial), os objetivos dessas lutas foram totalmente distorcidos pelas classes favorecidas (colonos, latifundiários, senhores escravagistas). Ficou claro, para a maioria das pessoas das classes desfavorecidas que a democracia, a liberdade, os direitos não são dádivas, mas objeto constante de luta, pois o bem-estar coletivo deve ser conquistado cotidianamente através de lutas. É da natureza das classes favorecidas instrumentalizarem as leis e as instituições do estado para favorecer seus interesses. Desse modo, não devemos ficar perplexos com as atitudes do prefeito de Manaus e das médicas recém-formadas em distorcerem os princípios de prioridades para vacinação durante a pandemia de covid-19 (janeiro de 2021) para se apropriarem do imunizante como se fossem de sua propriedade. Faltou a imprensa informar (e isso sempre falta) em que instituições essas médicas estudaram?

 

* Isaac Warden Lewis é professor aposentado da Faculdade de Educação/UFAM







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