Brasília (DF), 11 de novembro de 2024.
Ilustríssimo Professor Gustavo Seferian Scheffer Machado,
Presidente do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES-SN)
Ref.: AÇÕES REVISIONAIS PIS/PASEP.
Considerações Jurídicas. AJN
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Prezado Professor Gustavo,
Apresentamos os aspectos gerais que norteiam as demandas referentes à recomposição do saldo existente em conta vinculada PIS/PASEP, bem como o atual cenário de decisões judiciais.
RECOMPOSIÇÃO DO SALDO EXISTENTE EM CONTA VINCULADA AO PASEP
As ações judiciais relacionadas às contas do PIS e do PASEP envolvem a discussão sobre a defasagem dos valores depositados, em decorrência de má gestão por parte do Banco do Brasil. Essa má gestão se deu tanto por saques indevidos quanto pela não aplicação dos índices de juros e de correção monetária nos referidos depósitos.
Do ano de 1970 até o ano de 1988, os servidores públicos, assim que passassem a integrar os quadros da Administração Pública, seja na esfera Federal, Estadual ou Municipal, incluindo-se aí as autarquias e fundações, possuíam o direito de serem incluídos no Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PASEP). O PASEP foi criado pela Lei Complementar Federal nº, de 08, de 03 de dezembro de 1970, e, ao menos até a data de 5/10/1988 (promulgação da CF/88), tinha o objetivo de propiciar aos funcionários e servidores públicos, civis e militares, participação na receita dos órgãos e entidades integrantes da administração pública, direta e indireta, nos âmbitos federal, estadual e municipal, e das fundações, da mesma forma como operado com relação ao PIS, instituído meses antes pela Lei Complementar nº 7/1970 e direcionado aos trabalhadores do setor privado.
Em cumprimento ao referido programa, anualmente eram depositadas nas respectivas contas individuais do PASEP de cada servidor um determinado valor a título de participação no programa, denominado cota, a qual era calculada proporcionalmente ao tempo de serviço registrado na conta e ao salário anual do servidor. Todavia, o saque total dos valores depositados ficava condicionado à ocorrência de um dos eventos referenciados na lei (aposentadoria, invalidez e casamento do servidor).
Posteriormente, o PASEP e o PIS foram unificados pela Lei complementar nº 26/1975, a qual dispôs que tal unificação não afetaria os saldos das contas individuais existentes até então em ambos os programas, como também manteve as hipóteses já vistas para levantamento do saldo, quais sejam, a aposentadoria, a invalidez, e o casamento.
No entanto, com o advento da Constituição de 1988, a arrecadação decorrente das contribuições para o PIS/PASEP deixou de se destinar à formação do patrimônio do servidor público e passou a ter como finalidade única o financiamento do programa do seguro-desemprego e do abono salarial, conforme previsão constitucional (art. 239 da Constituição Federal de 88).
Não obstante, a Constituição de 1988 preservou o patrimônio acumulado até então nas respectivas contas individuais do PASEP em favor dos servidores participantes, inclusive mantendo os critérios de saque nas situações previstas nas leis específicas, com exceção da retirada por motivo de casamento, que deixou de ser fato gerador para o levantamento das cotas (dicção do art. 239, §2º, da CF/88).
Destaque-se que o §2º, do art. 239, da CF/88, que trata especificamente sobre o patrimônio acumulado pelos trabalhadores no programa PASEP, além de preservar as contas individuais já existentes anteriormente à Constituição, mantém a remuneração (atualização monetária) do saldo das contas preexistentes1.
Posteriormente, com o advento da MP 813/2017, convertida na Lei nº 13.677, de 2018, foram criadas novas hipóteses, tais como para maiores de 60 (sessenta) anos (se mulher) e 65 (sessenta e cinco) anos (se homem), bem como a todos os servidores públicos e militares, sendo que estes poderiam sacar os valores depositados do PASEP, independentemente de estarem nas condições elencadas pela Lei Complementar, limitado até o dia 28 de setembro de 2018.
Por força do art. 5º da referida Lei Complementar, a administração do Programa compete ao Banco do Brasil S.A., bem como a respectiva manutenção das contas individualizadas para cada trabalhador, de modo que a responsabilidade por eventuais saques indevidos ou má gestão dos valores depositados na conta do Pasep é atribuída ao Banco do Brasil.
Entretanto, muitos servidores, ao realizarem esses saques, perceberam que os valores estavam corrigidos por índices que não refletiam adequadamente a inflação do período. O Banco do Brasil, responsável pela administração desses recursos, deveria ter repassado parte dos rendimentos às contas individuais, o que não ocorreu em diversos casos.
1 Art. 239, §2º, da CF: Os patrimônios acumulados do Programa de Integração Social e do Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público são preservados, mantendo-se os critérios de saque nas situações previstas nas leis específicas, com exceção da retirada por motivo de casamento, ficando vedada a distribuição da arrecadação de que trata o "caput" deste artigo, para depósito nas contas individuais dos participantes.
Além disso, o banco utilizou índices inferiores aos estabelecidos pela legislação para realizar a correção dos valores e, em situações mais graves, efetuou saques nas contas individuais sem a devida restituição dos valores devidos. Isso resultou em servidores públicos recebendo montantes aquém do que lhes era devido, em virtude da correção inadequada que não compensou a perda do poder aquisitivo da moeda ao longo do tempo.
Diante desse cenário, foram propostas ações revisionais do PASEP, com pedido de reparação material decorrente da má gestão dos recursos da conta individual referente ao PASEP, tendo em vista que a correção monetária e os juros sobre os valores depositados deixaram de ser devidamente aplicados, resultando em créditos inferiores aos efetivamente devidos.
Em muitos processos o Poder Judiciário reconheceu o direito às diferenças decorrentes da correção dos saldos de PASEP em razão da defasagem dos valores depositados, tendo em vista a ausência de atualização monetária.
Em 2021, a discussão sobre a legitimidade do Banco do Brasil e a prescrição aplicável foi elevada à condição de recurso repetitivo pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), resultando no sobrestamento de todos os processos relacionados a esse tema.
Em 2023, o STJ reafirmou a legitimidade do Banco do Brasil e estabeleceu a prescrição de 10 anos, contando a partir da ciência inequívoca da lesão. Essa ciência é marcada pelo momento do saque dos valores, ocasião em que o servidor toma conhecimento da defasagem na atualização dos montantes.
Após a decisão do STJ, os trâmites processuais foram retomados. No entanto, o cenário atual apresenta sentenças majoritariamente desfavoráveis. A questão permanece controversa, uma vez que muitos Tribunais de Justiça ainda não se pronunciaram sobre a matéria, e a questão de mérito ainda não foi julgada pelo STJ. Isso mantém a sistemática de interposição de recursos.
No caso em questão, é incontestável que os saques foram realizados em valores inferiores ao que realmente deveria ter sido pago, o que justifica o ajuizamento das ações. Contudo, até o momento, os pedidos têm sido julgados improcedentes em suas respectivas sentenças, possivelmente devido ao grande volume de ações propostas após as primeiras decisões favoráveis.
De qualquer forma, as discussões têm sido submetidas aos Tribunais de Justiça em todo o país. Entretanto, ainda não há uma jurisprudência consolidada sobre o tema.
De maneira geral, o cenário é desfavorável e as expectativas para uma reformulação são difíceis.
Estamos à disposição para fornecer esclarecimentos adicionais, caso sejam necessários.
Cíntia Roberta da Cunha Fernandes
OAB/DF 26.668
Maria Eduarda Martins Guedes Nunes
OAB/DF 75.233
Assessoria Jurídica Nacional
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